UNIFORME: roupa escolhe Homem

Roupa escolhe Homem
É calção. Vestimenta curta, acima do joelho, rematada com meia comprida abaixo do joelho. A pele rugosa de 40 anos de vida, 20 de escutismo católico, torna-se visível, sensível (sentível) aos olhos e presença no toque do batuque do andar. As pernas dentro de calções são como que o ser menino para sempre, são como que o dizer que não se quer crescer nunca porque a meninice nos transformou em seres maiores, com sonhos maiores, com as mesmas dores que os outros têm, mas com outra vontade, com outra disposição, com outra entrega, com outro caminho, com outra história.


As mangas da camisa andam acima do cotovelo. Braço semi-exposto que quer dizer disponibilidade total. Não tenho medo nem perco tempo, estou sempre pronto. Não sujo punhos nem mangas porque as não tenho, e isso, quando nos exige deitar as mãos na massa, não nos atrapalha nem nos leva a perder tempo que faz falta para outras fainas. As redes são lançadas das nossas mãos e os cotovelos zelam livres para que toquem nos Homens que pescamos. Mostramos como se faina e mostramos quão livres estamos para o fazer, para o continuar fazendo. Somos exemplo nesta coisa séria de levar crianças e jovens a aprender brincando, escolhendo o que querem fazer, olhando em seu redor e descobrindo o que os faz verdadeiramente felizes. Perguntamos sempre o que mais os prende à maravilha de fazer coisas maravilhosas, eles respondem com o interior da alma, deixando ver o que perante outros escondem: querem fazer, querem viver, querem sonhar e concretizar sonhos fazendo.

O lenço que se dependura do pescoço num abraço apertado em nosso redor, liga o céu à terra no mesmo repente que nos lembra de que ações boas nos tornam melhores pessoas e tornam o mundo cheio de coisas melhores. Há um nó em lenço que viveu para lá do tempo que o fez. Todos os dias é assinalada a sua presença como se fosse feito de novo, sem nunca no entanto ter saído daquele lugar de aperto em que minhas mãos o colocaram. O que conta não é o nó do lenço feito para lembrar que não é mais possível esquecer o bem necessário, mesmo a quem mal nos faz. O mais importante é o bem que se faz, mesmo quando o lenço não anda visivelmente pendente de pescoço nosso, mas é como se lá estivesse sempre que colocamos os outros em melhor posição.

O mundo não melhorou, antes pelo contrário. O que melhorou foi a nossa capacidade de continuar a ver isso, de reconhecer que continua a ser importante andar de calção, mangas acima e lenço ao peito, levando mundo melhor nos dias em que o mundo está mais mal. O mundo não melhora se não olharmos para a roupa que trazemos e não renovarmos a capacidade de chegar onde devemos chegar. Nem mais cá, nem mais lá, ali, onde fazemos falta. Desde o espelho onde nos miramos e ajeitamos lenço, até ao outro lado da rua, ou ao outro lado do mundo. Fazemos falta onde existem vidas e as vidas em construção lembram que as pernas se fazem história pelas marcas que permitimos que nelas sejam inscritas… 

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